sábado, 4 de junho de 2011

Valores de referência: vilão ou aliado?

Quem acessou o site da Associação de Repórteres Fotográficos e Cinematográficos do Estado de São Paulo (Arfoc SP) conferiu que a entidade está convocando os associados para uma assembleia geral ordinária, que será realizada no próximo dia 7. Em pauta está discutir o balanço 2010 e atualizar a tabela de referência. Com base nessa informação levanto o acerca da tabela de referência é sua importância para a atuação do fotógrafo freelancer.

Número-guia
No mercado fotográfico há tabelas norteadoras de como cobrar pelo serviço prestado, inclusive no fotojornalismo. Sugestões de preço e até mesmo dicas de como avaliar o serviço prestado, considerando relação custo, hora, pré e pós-produção, desgaste do “equipa” e assim por diante. Interessante, pois a tabela é o guia e representa o mínimo recomendado. Além disso, diz respeito ao valor digno para que um profissional (no caso jornalista) possa efetuar o trabalho e viver dignamente, segundo defende as entidades de classe.

A Arfoc faz o indicativo para a categoria. De exemplo, temos a Arfoc Rio, que disponibiliza em seu site procedimentos e orientações para o fotógrafo seguir a tabela. “O roteiro para cálculo dos valores desta tabela foi retirado da publicação ‘Direitos Autorais dos Jornalistas’, série ‘Documentos da FENAJ’, vol. IV. De acordo com o artigo 10 do Código de Ética dos Jornalistas, o repórter-fotográfico não pode aceitar oferta de remuneração em desacordo com o piso salarial da categoria ou com a tabela fixada pela sua entidade de classe. Repórter Cinematográfico – Fotojornalista”.

E como o assunto é tabela e valor referencial para o trabalho independente, podemos destacar a Arfoc SP, que tem como referência o valor de R$ 425 reais (editorial) para saídas de até três horas e R$ 680 para saídas até 5 horas. A Arfoc Rio indica o valor de R$ 359 para saída até três horas, e R$ 543 para jornadas até cinco horas. O valor corresponde produção sem tratamento. No Rio, o mínimo salarial para contratação de R$ 4.092. A Arfoc Paraná trabalha com o valor de R$ 359 - até três horas. O piso salarial mínimo no Estado é de R$ 2.049 reais.

Valores norteadores existem, no entanto, nos bastidores, quem vive da fotografia sabe que o mar ora tem marés altas ora baixas e para fisgar um peixe, faz-se necessário aventurar num cenário (mercado) que, inclusive, há fotógrafos explorando os próprios colegas. A concorrência é acirrada e há quem diga que é difícil fazer cumprir o valor proposto. Quando se fala de acrescentar adicionais no orçamento, como transporte, hospedagem, alimentação, seguro, nota fiscal, credenciamento, entre outros, a coisa degringola de vez.

A língua afiada dos mais veteranos geralmente destila veneno apontando para os iniciantes e de fotógrafos aventureiros que vão disparar seus flashes na área. Assessorias, empresas e contratantes em geral, que não são bobos, ao invés de contratar um profissional formado e credenciado, apelam para o primeiro estrépito que aceita o orçamento de “duzentão”. Somado a isso, temos um cenário em que não há emprego (fixo) para todos, pois como dizem por aí: “balance a árvore que cai fotografo”. Logo, a alternativa, muitas vezes, é cair na barganha e solar o menor valor e dessa forma pegar o trabalho.

O presidente da Arfoc Paraná, Irany Carlos Magno, diz que alguns fotógrafos banalizam a profissão ao se sujeitarem a uma saída fotográfica abaixo do preço sugerido pela entidade. Além disso, “estragam o mercado”. Para Magno, o ideal é balizar o valor da proposta de trabalho sempre acima do indicativo, caso contrário não haveria necessidade de uma referência. Níveis de complexidade também precisam ser considerados (como o tempo, por exemplo).

Em relação ao valor de R$ 359 (vigente desde 2010), Magno diz que é pouco para o trabalho de um fotojornalista, considerando a saída fotográfica até três horas – sem tratamento de imagem. “Muito pouco na verdade, pelo custo de material, pelo tipo de trabalho que o fotógrafo vai prestar”, opina.


O diretor de imagem do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Paraná (Sindijor), repórter fotográfico e editor do Jornal do Estado (JE), Franklin de Freitas, reforça a importância de se ter uma tabela de referencia para poder instituir os valores de atuação, inclusive para trabalhos no qual não há envolvimento editorial. Afinal, com essa onda de “fotojornalismo” em casamento, em eventos diversos, o fotógrafo que tem experiência direta em fotojornalismo acaba angariando frilas. “Muitos contratantes pagam valores altos para som, iluminação, recepcionistas, decoração, entre outros, porém, querem pagar R$ 200 para um repórter fotográfico e repórter cinematográfico”, salienta.

Opinião
“Eu faço cumprir os valores”, diz Franklin de Freitas, que além de sua função como repórter fotográfico e editor de fotografia também faz alguns frilas para completar o orçamento. “Como diretor, o mínimo que tenho que fazer é valorizar o trabalho do repórter fotográfico e fazer os contratantes saberem que somos profissionais e vivemos da fotografia.”.


Joka Madruga, atuante como freelancer, também se posiciona a favor de um valor referencial e diz não ter dificuldades em estabelecer o valor proposto pela tabela. Entretanto, ressalta que não há como fugir da famosa “relação relativa” com o cliente. “Cada caso é um caso”, diz. Segundo Joka, trata-se do único instrumento que temos para balizar as negociações com os veículos de comunicação. “Os valores são uma referência, acredito que cada profissional sabe o seu valor e tem livre arbítrio para cobrar para mais ou para menos. Porém, quando cobra menos ele colabora para a desvalorização da profissão”, reforça.

O fotojornalista Rodolfo Bührer fez boas imagens como contratado no jornal Gazeta do Povo, agora está galgando espaço com sua empresa, a Agência La Imagem. Rodolfo defende a tabela e diz não ter dificuldades na hora de sentar à mesa para negociar. “A tabela da Arfoc é muito importante para que tenhamos uma base, um parâmetro institucionalizado e que deve ser respeitada por todos nós que gostamos da profissão e vivemos disso”, enfatiza.

Entretanto, Rodolfo chama atenção para o fato de que os valores praticados estão abaixo da expectativa. “Atualmente ela esta defasada, principalmente em relação com as tabelas de outros estados. Mas creio que nos dá um bom indicativo de valores”, opina.

Proteção legal
Um adendo para essa questão, pois tem relação contigua com o tema em questão. O contrato é o melhor caminho para evitar problemas, tanto no que diz respeito aos valores de trabalho e a respectiva reprodução de imagens. Bom tanto para o profissional quanto para o contratante.

O Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo disponibiliza em seu site sugestões de tabela e de modelos de contrato. A Associação Brasileira dos Fotógrafos de Publicidade também tem algumas sugestões.

Há quem defenda que, mesmo com a popularização/democratização da prática fotográfica, setores ditos profissionais não foram alterados ou sofreram perdas drásticas. O talento e a capacidade de efetuar o trabalho é característica de um bom fotógrafo. Entretanto, vale dizer que, há sim uma desconsideração pelo profissional – aquele que vive da fotografia. No balaio de gato comercial, amadores, aventureiros e profissionais são colocados no mesmo saco e a barganha ganha força. Novatos, na ansiedade de adentrarem no dito “mundo profissional”, arrebentam a profissão e o valor mínimo de trabalho. Sobre este ponto poderíamos viajar no raciocínio e ir longe. Questionamentos surgiriam, tal como a regulamentação da profissão, banalização do ato fotográfico, livre iniciativa, oferta e procura e assim por diante. Porém, o problema é bem complexo, afinal envolve uma profissão, uma forma de ganhar a vida. Mas, diante dessa problemática, podemos focar e avaliar casos e deixar que cada um (fotógrafo ou contratante) avalie sua respectiva área de atuação.


Foto: Heuler Andrey (Franklin de Freitas)

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