quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

S.O.S Santa Catarina I

Rafaelle Mendes, departamento de fotografia da Assessoria de Comunicação da Prefeitura Municipal de Campo Largo.





Fotos: Rafaelle Mendes



Fui para Itajaí no último final de semana, com o intuito de trabalhar como voluntária no Parque da Marejada. Desci junto com um caminhão de donativos que saiu de Campo Largo (região Metropolitana de Curitiba) com destino a Paróquia Monte Alegre em Camburiú. Já na BR pelo número de deslizamentos, dava pra sentir um pouco do que vinha adiante, mas ainda assim eu não fazia idéia. E mesmo com a câmera na bagagem não sabia se teria coragem pra fotografar tudo o que visse pela frente.

Após descarregarmos o caminhão em Monte Alegre, fomos até um dos bairros mais atingidos de Itajaí, o Cidade Nova. Não importava para que lado eu olhasse, o cenário era o mesmo em todas as ruas: pilhas e mais pilhas de entulho – leiam-se móveis destruídos, roupas, brinquedos e muito lixo – tudo envolto em lama.

Mas além do choque visual, nunca vou me esquecer do cheiro daquele lugar, era um cheiro de lodo, um cheiro de podre, um cheiro de morte. E foi em uma dessas ruas que eu ouvi “Venha fotografar minha casa moça”, era o chamado da Dona Expedita Gonçalves da Silva Viana, 56 anos, há seis anos moradora da região.

“Não sobrou nada, perdi tudo. Até meus documentos, e por causa disso não sei se vou conseguir fazer meu cadastro pra pegar comida” – isso porque a Defesa Civil só está entregando cestas básicas para quem está cadastrado, numa tentativa de ajudar somente os que realmente foram atingidos – foi a primeira coisa que disse ao me receber no portão do que sobrou do lugar onde morava.

Na garagem dava para ver as marcas do nível em que a água chegou às roupas ainda estavam penduras no varal - mais ou menos 1,70m. Por todo o lado era somente lama e móveis revirados.

Expedita me contou que no domingo acordou às quatro e meia da manhã com água pra cima do joelho, sem luz. Juntou-se aos outros moradores da casa – 8 pessoas entre netos e filhos e 10 cachorros – na cozinha e esperou. E enquanto a água subia, lá fora ela só ouvia os animais do pasto ao lado da sua casa tentando se salvar.

Disse que abandonou a casa na segunda (24) de manhã e havia acabado de voltar, foi então que me chamou pra ver a cozinha onde o cheiro de podre era insuportável e ao olhar pro chão da cozinha além da geladeira cheia de lama atravessada no chão uma pata traseira de uma vaca no meio da cozinha fez meu estômago embrulhar. Foi o único momento em que a câmera ficou pendurada no meu pescoço, não tive coragem. A angústia e a agonia que senti ali, espero não sentir tão cedo novamente.

“Ta vendo? Sabe Deus quantos dias vou levar pra limpar tudo isso”, exclamou e começou a chorar. Segurei o quanto pude pra não chorar, mas foi praticamente impossível ver tal cena e não me colocar no lugar daquela senhora. Fiz algumas fotos, fui até o carro peguei uma cesta básica e uma caixa de leite entreguei a ela e me despedi, desejando força e coragem pra continuar.

De lá segui para o Parque da Marejada pra continuar ajudando, e apesar das caras cansadas que encontrei nenhuma delas me negou um sorriso. Outra coisa que me marcou eram os aplausos e gritos de euforia a cada término de carregamento ou descarregamento dos caminhões de mantimentos, que chegavam e saiam do centro. Verdadeiro trabalho de formiguinhas.

E foi lá que realmente entendi que boa ação, espírito de solidariedade está no coração de cada um, quando conheci o pequeno João Pedro Vaz de 7 anos, o qual eu fotografava de longe e me aproximei perguntando se poderia fotografá-lo e se a mãe dele que havia o levado para lá, quando ele sorriu e disse: “ Não foi ela que veio, eu que pedi pra ela me trazer pra ajudar, porque eu sei que tem um monte de gente precisando”.

Presenciar esse tipo de tragédia me mostra que temos que agradecer mais e reclamar menos. E que fazer a diferença não é tão difícil como se imagina, basta boa vontade.


de Rafaelle Mendes
Departamento de fotografia da Assessoria de Comunicação da Prefeitura Municipal de Campo Largo


3 comentários:

Anônimo disse...

Muita loucura mesmo a situação dessas pessoas... Foi legal uma galera ter ido ajudar... Parabéns pelo ímpeto Rafa...

Anônimo disse...

meu rosto até formigou lendo, quase pude sentir a dor da perda da Dona Expedita.
Se de todos, cada um fizer uma coisa pequena em beneficio de quem precisa, no final teremos....

Anônimo disse...

essa é minha amiga, colega e parceria rafaelle mendes mostrando mais uma vez a guerreira que é. te admiro mto, garota! continue sempre, sempre assim!!!